domingo, 2 de novembro de 2008

'Um dia, alguém fez isso por mim'

MATEUS VIEIRA MESTRE Mauro Constantino dá aula para alunos do Ensino Médio:

MESTRE Mauro Constantino dá aula para alunos do Ensino Médio: "De todas as instituições que existem, só a escola pode discutir a política"

"A política é um processo e ele tem de saber que faz parte dele." Assim Mauro Constantino, 46 anos, professor de Geografia e Atualidades, definiu a importância do envolvimento dos jovens com o que a maioria deles define, hoje, como um "assunto chato" e, portanto, de pouco interesse.

Envolvido com alunos que cursam o Ensino Médio,Constantino entende como desnecessário aplicar a política diretamente na grade de ensino das escolas. "Aí entra o problema da formação dos professores. Muitos colegas têm a cabeça fragmentada, fruto da tecnologia. O mundo, aliás, é assim: tem de ser o mais prático possível, ver as coisas por pedaço. Às vezes, penso que sou eu o errado porque, se tenho de falar de história, é óbvio que preciso discutir sobre economia e política. Está tudo interligado", comentou. "O aluno também age de maneira fragmentada e se quiser saber o que é democracia, digita no Google (site de busca). Só que isso não quer dizer que vai descobrir o significado."

Falar sobre o assunto em sala de aula para o professor é algo inevitável. "Falta discussão dos conceitos nas escolas. Democracia é o governo do povo, mas quem é o povo? Se o pai não aceita que o filho tenha outras fontes de pensamento a respeito de política, já é um problema, também. Isso pode até virar uma desculpa se o aluno for mal na prova, por exemplo. Ele vai dizer: 'Também, o professor fica falando de política em vez de passar a matéria'. É preciso, antes de tudo, ter a visão de República: pode não ser do meu interesse, mas e os outros? De todas as instituições que existem, só a escola pode fazer isso. Os partidos políticos, as igrejas, sempre vão puxar 'a sardinha' para o lado deles. Isso é natural. A escola, pelo contrário, não precisa ter uma ideologia: ela discute todas.
Se faz isso, o aluno vai se interessar ou não, depende dele. Eu sempre penso que é preciso ter dedicação naquilo que se faz, mesmo quando você está exausto, porque algum dia alguém já fez isso por mim."


Mais cômodo - Para o professor e bacharel em Direito Luis Roberto Zanarella Cruz, responsável pelas disciplinas de Geografia e História, o interesse dos estudantes pela política existe. "O que não há é o engajamento de seu trabalho e reflexão em atos participativos. Nessa idade, eles querem 'agir', tirar a teoria do papel e pôr em prática. Mas as salas de aula limitam o agir em prol de um calendário escolar, em que a quantidade de aulas é mais visada que a qualidade das mesmas."

Cruz ainda ressaltou que a educação política nunca esteve fora das salas de aula. "O que se faz tanto pelos professores quanto por escolas é evitar o tema e se prender aos moldes curriculares. É como comum os jovens afirmarem, às vésperas de eleições, que todos são iguais; que quando se chega 'lá' (cargo), o poder sobe à cabeça; que só pensam no salário, e por aí vai. Quando pergunto por que não se candidatam ou quem na classe pretende ser um agente político, eles trocam olhares entre si e o silêncio se faz. Digo que uma sociedade é o espelho de um povo e que, se existem desmandos e corrupção, é pelo fato de tolerarmos e nos omitirmos. Para muitos, o não-ensinar é mais cômodo e prático."

O professor comentou, inclusive, que as discussões sobre política na sala de aula renderam frutos. "A fiscalização dos atos oficiais e dos políticos deve partir dos alunos junto às estruturas de poder de suas cidades. Uma eleição não é um momento único, mas ato contínuo ao longo do mandato. A ONG Voto Consciente abarca alunos meus que foram dinâmicos nas aulas e isso eles sempre gostaram de discutir. Creio que o trabalho de convidar a sociedade a sair do comodismo e participar do dia-a-dia da política local é útil no resgate da cidadania."

EMERSON LEITE

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